tribuna socialista

sexta-feira, novembro 20, 2009

FINANCIARIZAÇÃO DA VIDA DE TODOS OS DIAS! - 2ª parte ...

























Um camarada e amigo, o Manuel Monteiro, pegou na posta anterior e resolveu adaptá-la com os seus contributos e ideias. Ficou assim e ficou bem, já que dá para pensar, debater e agir.



João Pedro Freire


Hoje em dia, a exagerada preocupação com a nossa inclusão social faz-nos crer, que a mesma passa pela obrigatoriedade de se possuir/consumir determinados bens. Quem não tem esses bens ou comportamentos de consumo, é olhado como um "excluído". Na generalidade, somos avaliados por aquilo que possuímos/exibimos e não pelos nossos princípios/comportamentos.

Para fazer face a esta necessidade de consumo, muitas vezes incomportável para o rendimento auferido pela generalidade da população, recorre-se ao crédito bancário. Assim a "necessidade" que sentimos de consumir, para nos sentirmos "integrados" na sociedade, leva-nos a recorrer ao crédito bancário, o qual também é uma forma de consumo (pois os bancos estão a vender a possibilidade de consumir hoje, com o rendimento que eventualmente havemos de receber no futuro - aplicando ao empréstmo a sua margem, i.e. os juros).

Mais uma vez, somos avaliados em função do que consumimos, neste caso, o crédito bancário. Os bancos, através das suas imensas bases de dados de risco (de crédito), passam também por ser uma espécie de "termómetro" aceite para se aferir sobre a "idoineidade" e a "respeitabilidade" de cada um.

Esta FINANCIARIZAÇÃO (atenção, não sei se esta palavra existe!) da vida de todos os dias de cada um, é, em si mesmo e nos efeitos que tem, uma espécie de novo totalitarismo dos nossos dias. Acrescento ainda que esta FINANCIARIZAÇÃO é uma peça fundamental desse novo totalitarismo, composto pelas seguintes etapas:

  • As empresas nos entido de realizar o seu objectivo (vender para obter lucro), bombardeiam os consumidores/trabalhadores com publicidade.

  • Os consumidores/trabalhadores, iludidos na necessidade de possuir bens/serviços de que muitas vezes não precisam, adquirem os mesmos, com recurso ao crédito bancário.

  • Os consumidores/trabalhadores na sua generalidade (já bastante endividados), por medo de perder o seu posto de trabalho (o que impossibilitava o pagamento das suas dívidas) não se atrevem a reclamar juntos dos seus empregadores (as empresas em setido lato, que os incentivaram a consumir) por melhores condições de trabalho/salariais ou não se atrevem a bater com a porta à procura de melhor.

Assim se completa o ciclo totalitário que se vive na actualidade. Ao observar este ciclo, vem à cabeça aquela imagem dos trabalhadores de uma fazenda qualquer (isolada no meio do nada), obrigados a gastar a migalha de rendimento que lhes é pago na loja da própria fazenda (propriedade do fazendeiro), para comprar bens essenciais a preços exagerados. A filosofia é a mesma, só que agora, o fazendeiro (neste caso o banco) adianta o dinheiro quando o trabalhador quer comsumir mais.

Como nos libertar deste ciclo?

Existem alguns caminhos possíveis.


  1. Embora inconveniente para a maioria dos interesses instalados, uma medida possível seria a sensibilização para um consumo mais cuidado.

  2. Tentativa de alterar os valores sociais atribuídos ao acto de consumir e/ou possuir. Ensinar a valorizar as pessoas pelas suas qualidades.

O caminho mais simples e eficaz, foi o escolhido por muitos americanos, os NINJA.

3. A presente crise económica/financeira mundial foi desencadeada pelos NINJA. NINJA é uma classificação dada pelos bancos americanos a uma faixa da população americana (a quem esses bancos na sua ânsia de obter lucro) concederam crédito para adquirirem casa própria. Os NINJA ao repararem que nunca teriam hipótese de pagar os seus empréstimos, não se ralaram com mais nada e sem qualquer sentido de culpa (ou vergonha), entregaram as suas casas às instituições de crédito. Assim, com esta acção, deu-se o quase colapso do sistema financeiro mundial (não fosse o apoio dado pelos governos). Afinal, o simples cidadão (quando unido em grandes números) ainda consegue lutar e derrubar o novo totalitarismo em que vivemos. Para aqueles que acreditam na mudança, este simples exemplo é um tremendo sinal de esperança no futuro e um grande incentivo para continuar a lutar.

Já agora para animar, o significado de NINJA aqui utilizado é: NO INCOME, NO JOBS, NO ASSETS.

Assim, estes cidadãos ao virarem as costas aos conceitos estabelecidos pelos bancos, quase derrubaram todo o sistema financeiro.

Sim, é possível viver sem uma conta bancária e sem os bancos. É possível viver em liberdade!

Manuel Monteiro

2 comentários:

Anónimo disse...

Não creio que estejamos em sintonia; se nesta sociedade é impossível viver-se sem conta bancária, isso não significa que nós tenhamos que cair nas armadilhas que estes bancos nos colocam e nos deixemos seduzir pela compra de acções, ou títulos de fundos, ou outros produtos financeiros, ou que tenhamos recurso ao «crédito fácil» (?) mas extremamente caro, etc.
Penso que podemos colocar as nossas poupanças em bancos cooperativos ou mutualistas (o Montepio? o Crédito Agrícola?) e deixarmos os bancos comerciais ou de estado. Não nos vamos privar assim, no todo, de serviços úteis que uma instituição bancária fornece!

Eu digo isto porque uma campanha (a sério) de desinscrição nos bancos e de inscrição em instituições de crédito mutualistas seria um bom sistema de boicote. Ou seja, é realizável «pelo cidadão comum», não é um auto-sacrifício inflingido pela pessoa!
Manuel Baptista

João Pedro Freire disse...

Caro Manuel Baptista,

Onde e como é que o Montepio ou a Ciaxa Agrícola são "bancos cooperativos ou mutualistas" ? Só se for na publicidade que eles mesmo fazem?
Os próprios administradores são os mesmos que tb já estiveram nos "outros" bancos, Estado e privados!
O exemplo dos "ninja" é um exemplo sobre o qual gostaria de ver mais informação e também mais debate entre quem se interessa por um sistema financeiro que não se organize e funcione como o actual.
Também continua em debate: como é possível viver sem uma conta bancária?

João Pedro Freire