tribuna socialista

sexta-feira, agosto 07, 2009

ALTERNATIVA ... PRECISA-SE! ... MAS É PRECISO EXPLICAR MELHOR ... (UMA RESPOSTA A UM COMENTÁRIO)

Em jeito de resposta a um comentário do Nuno Cardoso da Silva na posta ALTERNATIVA ... PRECISA-SE! ... MAS É PRECISO EXPLICAR MELHOR ... , Paulo F. Silva, bloquista e membro da sua Mesa Nacional, avança com a sua opinião pessoal. Opinião que se edita como forma de se proporcionar debate !



Meu caro João Pedro Freire,

Ainda que com algum atraso, em relação ao que eu próprio me tinha proposto, aqui vai o que se me oferece escrever a propósito da questão colocada há dias pelo Nuno Cardoso da Silva.

Antes de mais um pequeno esclarecimento. Este texto não é a resposta de um mesário bloquista, apenas de um militante da Esquerda Socialista que, não por mero acaso, é aderente do Bloco de Esquerda e que, circunstancialmente, é membro da sua Mesa Nacional. Nada mais.

Propriamente sobre a “pergunta essencial” do Nuno Cardoso da Silva, confesso que, à partida, me pareceu uma provocação amiga. Provocação porque é descontextualizada, face à posta em causa, e simultaneamente amiga porque não é ofensiva. Desconheço se assim é, ou não, mas a minha opinião aqui fica, e à qual darás o destino que muito bem entenderes.

A “pergunta essencial” parte do princípio, a meu ver errado, de que tudo gira em torno da economia, tudo o que acontece é assim, ou assado, porque o dinheiro assim o dita. Há imensos anos que discordo desta ideia. O dinheiro, a economia, é importante, mais ainda mais relevantes são as movimentações sociais. A História está aí para nos mostrar que todos os momentos em que o mundo pulou e avançou aconteceram porque as pessoas se agregaram em torno de uma ideia, mesmo quando a ideia não ia muito além da simples satisfação da básica necessidade de sobrevivência. Assim sendo, e porque toda a posta do João Pedro é construída, e bem, em torno da ideia de que a Esquerda Socialista é pólo motor de “uma nova alternativa de Governo com políticas democráticas e socialistas”, percebo as dúvidas e as perplexidades que se lhe colocam na perspectiva do processo evolutivo das dinâmicas sociais inerentes à referida alternativa. Em nenhum momento se diz, nesta posta e em todos os outros escritos do João Pedro Freire, que o caminho é fácil e linear. É óbvio que não! Mas ele está atento, e na expectativa do que pode, eventualmente, vir a acontecer…

Por isso questiona-se sobre o que pode acontecer num eventual cenário pós-eleitoral sem maioria absoluta. Por isso recorda que o Bloco de Esquerda já recusou, de diversas formas e através de vários dos seus protagonistas, quaisquer alianças com um PS com maioria relativa. Por isso evoca ele a possibilidade dos “limites” da Esquerda Socialista serem suplantados pelas dinâmicas dos movimentos sociais, dos trabalhadores, e dos novos movimentos de cidadania.

Daí também que eu pense que a “pergunta essencial” – “Se o BE tivesse a possibilidade de integrar um governo de coligação de partidos de esquerda, imporia como condição a nacionalização de toda a banca e a transformação da banca em actividade sem fins lucrativos?” – é, em simultâneo, provocatória e amiga. Por um lado, a questão, ainda que hipotética, nem se coloca! Por outro, o Bloco em situação alguma estará em condições de “impor” o que quer que seja!

Tanto quanto sei, em circunstância alguma se colocou, no seio do Bloco de Esquerda, a possibilidade da “nacionalização de toda a banca”. O Bloco (tal como Karl Marx!) não é contra a actividade privada, é pela defesa de princípios em nome do que é público e de todos. O Bloco não é contra a banca privada, é pela defesa de políticas públicas e socialistas, inclusive, neste sector de actividade. E destes princípios é evidente que o Bloco não poderá nunca abdicar! Seja em que cenários for.

É evidente que a banca é um “sector estratégico” e que, portanto, deve ser tendencialmente (a expressão é da minha autoria!) público, porque a sua acção tem implicações directas e objectivas na vida quotidiana dos cidadãos. A Caixa Geral de Depósitos (CGD), enquanto braço comercial do Estado no sector da banca, deveria ser orientada por políticas totalmente divergentes das nossas conhecidas, ou seja, não faz sentido que pratique juros elevados que apenas favorecem o jogo especulativo, prejudicando os cidadãos de uma forma geral. E também não escondo um sorriso ao imaginar o que aconteceria ao BCP, ao BES e por aí fora se existisse uma CGD que aplicasse políticas públicas e, portanto, dirigisse a política de crédito do país…

Mas, então, a banca seria transformada numa espécie de “actividade sem fins lucrativos”? Claro que não!, isso é outro pequeno detalhe provocatório na “pergunta essencial”… A banca deveria ser uma actividade comercial que, como tal, se sujeitaria às condições da oferta e da procura. Em termos muito práticos digo mesmo que se essa banca privada que tanto preocupa o Nuno Cardoso da Silva der prejuízos então que feche a porta. Até porque a filantropia não se pratica por esta área…

Entre dez milhões de cidadãos diariamente prejudicados por políticas orientadas unicamente em função do lucro e meia dúzia de senhores que engordam escandalosamente todos os dias, eu não hesito.

Um abraço,

Paulo F. Silva

3 comentários:

Nuno Cardoso da Silva disse...

Caro Paulo Silva,

Em primeiro lugar, os meus agradecimentos pela resposta dada.

A questão era provocatória, sim, mas era também amigável. Não pretendia agredir ninguém, mas pretendia convidar o BE a definir-se melhor numa questão essencial, para que uma coligação à esquerda possa ser diferente de uma coligação ao centro ou à direita.

Primeiro pressuposto: a actividade bancária é essencial para o bom funcionamento da economia, mas se for utilizada de forma sistematicamente especulativa acaba por ser destrutiva dessa mesma economia.

Segundo pressuposto: os lucros da banca são custos acrescidos e desnecessários para a actividade produtiva e para os consumidores. A banca utiliza dinheiro que não é seu nas operações de crédito, embora corra um risco próprio. Assim, os custos do crédito e outros serviços bancários devem ser apenas aqueles que são necessários para cobrir as despesas, cobrir o risco de não cumprimento por parte dos devedores, e investir em equipamento, infraestruturas e inovação. O lucro na banca é perverso, porque afecta o poder de compra dos particulares e a competitividade das empresas. Pelo que prejudica a economia no seu todo.

Terceiro pressuposto: a mera nacionalização da banca não seria solução, porque o estado poderia optar por actuar da mesma forma predatória da banca privada. Como se vê na CGD, onde o estado está mais interessado em ter uma fonte de rendimento do que em servir os interesses da economia. Por isso seria necessário transformar a banca, por via legislativa, numa actividade sem fins lucrativos. Os lucros que a banca tivesse deveriam ser devolvidos aos seus clientes. Os eventuais prejuízos poderiam ser compensados por uma sobretaxa nos serviços prestados no exercício subsequente.

Recusar a nacionalização da banca, nos termos descritos, é aceitar a continuação da actividade predatória dessa banca, com desvio de recursos da actividade produtiva para a actividade especulativa. Um partido que se diz de esquerda não pode pactuar com a continuação desse abuso, nem pode disfarçar essa falha com uma exigência da banca pagar mais impostos. Mais impostos apenas diminuiria um pouco a sangria que a banca causa na economia, sem resolver o problema.

A questão é essencial e determina se o BE está realmente na esquerda, ou apenas à esquerda do PS.

Um abraço

Nuno Cardoso da Silva

Anónimo disse...

Caro Nuno Cardoso da Silva

Plenamente de acordo quanto ao primeiro pressuposto, mas chamo a atenção para a expressão "sistematicamente especulativa". O que a Esquerda Socialista almeja é exactamente o oposto.

Idem, aspas em relação ao segundo pressuposto.

Terceiro pressuposto. Parece-me que o Nuno ainda não percebeu que o Bloco não defende a nacionalização da banca, pelo menos nos termos que usa. O que está errado é a CGD assumir-se como o braço comercial do Estado, nada mais, e para aquela instituição aplicar políticas de interesse público, como as defini no texto anterior, não é necessária a transformação da CGD numa espécie de associação de solidariedade social.

O Bloco não pactua com a actividade predatória da banca e, por isso, enquanto não for possível alterar o actual estado de coisas relativamente à política operacional da CGD, enquanto não existir um Governo que execute políticas públicas e socialistas, defende o agravamento fiscal da actividade. É uma forma inequívoca de minorar o roubo escandaloso quer a banca concretiza sobre os bolsos de todos a cada minuto que passa.

Sobre o posicionamento no espectro partidário, os actos do Bloco falam bem melhor que as minhas palavras.

Um abraço,

Paulo F. Silva

Nuno Cardoso da Silva disse...

Caro Paulo,

Fico satisfeito por concordarmos em tantas coisas. Só não percebo porque é que, então, o BE não defende a nacionalização da banca. Parece um pouco contraditório Ou haverá alguma razão - que eu de facto não entendo - para não o propor? É a única medida que acabaria com as deficiências do funcionamento da banca, tanto privada como pública, que ambos identificámos.

Há aqui um mistério que não consigo resolver...

Um abraço

Nuno Cardoso da Silva