tribuna socialista

segunda-feira, agosto 17, 2009

COMO REAGIR, À ESQUERDA, A UM CENÁRIO PÓS-ELEITORAL SEM MAIORIA ABSOLUTA ?

As sucessivas intervenções públicas de dirigentes das esquerdas do PS, propondo "soluções governativas" para um cenário pós-eleitoral sem maioria absoluta merecem uma reflexão mais cuidada que aquela que tem sido feita, reactivamente, pelas direcções do BE e do PCP.

Antes de mais, essas intervenções de dirigentes do PS, são mais um sintoma de que já nem o PS acredita na reedição de uma maioria absoluta.

Ora um cenário de triunfo do PS sem maioria absoluta num quadro parlamentar e social de maioria das esquerdas, obriga TODAS as esquerdas a reflectir sobre qual a melhor solução. Porque, desta forma, a actual direcção sócratica não estará em condições de repetir as políticas neo-liberais e de direita dos últimos quatro anos, a não ser que surjam alianças pontuais ou duradouras com o PSD e o CDS ou só com um ou com outro. Não andaremos muito longe da verdade, se concluirmos também que a maioria da base militante do PS não apoiaria mais quatro anos de políticas governamentais de direita.

É compreensível e até correcto que tanto o Bloco como o PCP, rejeitem qualquer aliança com o PS tendo em conta as políticas que foram desenvolvidas pelo governo Sócrates. Essas políticas são e serão insustentáveis numa perspectiva de um governo que queiram dar uma outra dinâmica ao País. Uma dinâmica mais democrática, mais socialista e radicalmente anti-neo-liberal.

Mas o PS é muito mais que a sua direcção Sócrates. É sintomática e até relevante, que as esquerdas do PS se movimentem, cada vez, com mais ruído e visibilidade. Ignorar este dado, continuando a emitir posições como as que têm sido dadas pelo BE e pelo PCP, é contribuir para que o PS seja novamente lançado para os braços da direita - política e dos interesses económicos - isolando as suas correntes de esquerda.

A rejeição de políticas de direita não pode significar a rejeição, pura e simples, de um diálogo, sob condições, com o PS. O PS não deve ser encarado como uma coutada de Sócrates e da sua direcção. O PS tem uma base social e militante que são imprescindiveis e incontornáveis para uma alternativa de esquerda para que se consiga outra governação.

O diálogo entre as esquerdas não tem de ser programado e até agendado. Há temas que podem ser lançados para discussão pública, como a questão da nacionalização dos sectores estratégicos da economia, como a necessária e urgente revisão do Código de Trabalho do governo Sócrates, como a redefinição de novas políticas de investimento público, como a reforma da segurança social, como a crescente precarização do trabalho, como a defesa da escola pública e do serviço nacional de saúde , etc, etc. As esquerdas podem ter entre si e estabelecer entre si, na sua base social e militante, espaços de discussão e de reflexão, sem que se caia na obrigatoriedade de um debate formal entre direcções partidárias. O debate que muitas vezes se consegue na blogosfera, é um bom exemplo, já que é, quase sempre, transversal, aberto e livre.

As esquerdas não podem chegar às eleições com a eterna imagem de, ao contrário da direita, nunca conseguirem dialogar para a definição de um governo de esquerda e só conseguirem, cada partido de esquerda, apresentar programas "muito bons", mas que nunca passam disso!

Havendo uma maioria social de esquerda, não há razão para que as direcções dos partidos de esquerda continuem a comportar-se, entre si, como autistas!

Uma alternativa de esquerda não se pode resumir ao mero somatório de deputados parlamentares para dar um resultado maioritário. Essa alternativa precisa de saber e conseguir discutir claramente programas e politicas governamentais. Essa é uma discussão prévia e não posterior!

Imaginem qual seria a repercussão política na Europa, de um governo das esquerdas em Portugal com um programa e políticas de sentido democrático e socialista e que contrariasse os últimos anos de politicas de direita e neo-liberais? Decerto que ainda se lembram do efeito que os "Não" franceses e holandeses tiveram em toda a Europa ...

6 comentários:

Jorge Caetano disse...

Efectivamente o PS Socialista não é um coutada do Sócrates. E neste sentido acredito por exemplo que um Governo de Direita não teria a capacidade nem a "coragem política" para materializar as políticas neo- liberais e anti- sociais das quais somos vítimas de modo mais ou menos visível há cerca de dezoito anos. Mas a engrenagem dos Partidos Socialistas Europeus centra-se numa lógica de dominação quer interna quer externa que se move no âmbito de uma manipulação cada vez mais vez mais subtilmente elaborada, metodicamente construída no sentido de abafar a diferença, as diversas identidades. Por este motivo, embora concorde contigo sobre a necessidade de fazer convergir as esquerdas numa lógica comum, eu, ate digo neste momento numa lógica de mínimo denominador comum, parece difícil encontrar pontos de convergência com esta direcção do PS. Seria necessário que essas esquerdas do PS começassem a ter mais protagonismo mediático, e não se alojassem no interior da blog esfera. Quer se queira quer não esta dimensão é importante, é preciso que se saiba que as coisas existem, que são passíveis de ter credibilidade política e não se fecharem em discussões ainda que importantes, mas que não se projectam, não se estendem ao locatário mais importante: às pessoas, e isto, pode ser decisivo, que não abdicam de votar PS, porque têm medo da Direita mais radical e conservadora. Eu sei que não dei soluções, mas tenho a certeza que com esta Direcção do PS não existe nenhuma possibilidade de diálogo e consenso real, pragmático no bom sentido, acerca do que pode ser uma alternativa de esquerda. Pelo meu pouco diálogo com militantes socialistas, constato de facto uma enorme desilusão em relação ao aparelho e à prática castradora das várias Direcções do PS. Mas também constato, e nos caso do concelho de Matosinhos é paradigmático, que a alternativa de esquerda ao actual executivo, é o Narciso Miranda. E isto deixa-me desarmado, momentaneamente politicamente impotente e além de tudo triste. A questão da alternativa é complexa, mas não admira nada que possa emergir, para nossa infelicidade, uma alternativa de Bloco Central.

João Pedro Freire disse...

Numa perspectiva de diálogo entre as esquerdas, na busca por uma alternativa que emerja da área da esquerda socialista, nessa discussão por novas políticas, é claro que a corrente personificada pela actual direcção sócratica não entra nessa discussão, nem acrecenta nada de novo à discussão por políticas democráticas e socialistas.
José Sócrates, a sua direcção partidária e o seu governo nos últimos quatro anos, são mais uma parte da tralha neo-liberal que tem dominado Portugal nos últimos 18 anos e a Europa ainda há mais tempo.
Relativamente a Matosinhos, não estou de acordo com o Jorge Caetano quando considera que "é paradigmático, que a alternativa de esquerda ao actual executivo, é o Narciso Miranda". A alternativa a Guilherme Pinto não é mais do mesmo. Isso seria uma espécie de mexicanização (!) de Matosinhos, com o aparelho do PS a produzir mais aparelho para se ir alternando no poder camarário. Se o Bloco conseguir um resultado próximo ou semelhante ao que obteve nas últimas europeias, certamente que isso corresponderia à adesão de muita gente que habitualmente ou já não vota, ou votava PS. E isso seria um dado muito importante, para se conseguir um movimento alternativo de esquerda em Matosinhos.

Jorge Caetano disse...

Eu não defendi,longe de mim, tal postura, que a alternativa ao Guilherme Pinto passaria pelo Narciso. Não poderia de modo algum defender tal tese política. O que eu me limitei a analisar, foi partindo de um certa captação empírica e claro sem rigor, que conheço militantes socialistas que trabalham numa perspectiva crítica em relação ao aparelho do Partido Socialista, e que em vez de reconhecerem no Bloco uma alternativa a este marasmo político, seja ele " guilhermista" ou " narcisista", optam por este último como sendo o salvador e de certo o modo o redentor. Aliás, no comentário que fiz digo claramente que esta situação, que é objectiva, que é um dado e não um juízo ou a manifestação de uma vontade, me deixa preocupado e triste por ver a política reduzida a esta podridão e até reforço a tua ideia de que provavelmente não é só mais do mesmo mas "pior" em relação ao mesmo. O facto de se estar afastado do poder político de um modo mais directo pode desembocar numa avidez desenfreada que com consequências ainda difícil de prever

João Pedro Freire disse...

Caro Jorge,

Estamos de acordo!

b m disse...

Um abraço à Tribuna Socialista.
Que espero continue em férias mas atenta como sempre.

E já agora um breve comentário:
As esquerdas do PS movimentam-se, é verdade, mas como dialogar c/ elas se nenhuma expressão institucional externa apresentam?
Os blogs e as conversas de café parecem-me curtos...
Gostei sinceramente de o conhecer em Moledo.
Um abraço,
BM

João Pedro Freire disse...

Caro BM,

Também gostei de o conhecer por terras do Minho. O Mundo é mesmo uma pequena aldeia ...

Concordo consigo que a representação das esquerdas do PS é um problema ... todos sabemos que existem, mas mostram-se muito pouco, para além dos domínios da blogosfera ...
Já o Jorge Caetano, nos comentários a esta posta, referia o mesmo problema: "
Mas a engrenagem dos Partidos Socialistas Europeus centra-se numa lógica de dominação quer interna quer externa que se move no âmbito de uma manipulação cada vez mais vez mais subtilmente elaborada, metodicamente construída no sentido de abafar a diferença, as diversas identidades".
Passa também por essas esquerdas alguma iniciativa política para demonstrarem que o PS não é uma coutada de Sócrates, nem um domínio acritico da sua direcção política.
Um abraço,
João Pedro Freire