Francisco Louçã dá hoje uma extensa entrevista ao Público.
Parece-nos que, desta vez, Francisco Louçã não é muito claro no que diz respeito à definição da "maioria de esquerda" que o Bloco pretende para integrar como governo.
Percebemos que há um processo de recomposição à esquerda. Percebemos também que, nesse processo, o PS poderá não resistir à saída de um importante sector dos seus militantes. Mas o mesmo pode suceder ao próprio Bloco de Esquerda e ao PCP.
Trata-se de um processo que tem muito a ver com a redefinição e reagrupamento do sector da esquerda socialista. Alguns passos já aconteceram em países como a Alemanha (Die Lienke) e França (Parti de Gauche e NPA).
Só que é um processo lento e Francisco Louçã, parece que, às vezes, avança com perspectivas que já parecem balanços e certezas.
A realidade que hoje temos é ainda muito diferente. Quer gostemos ou não, uma maioria de esquerda tem, incontornávelmente, de contar com o PS que temos e com o PCP que temos.
O grande desafio que o Bloco de Esquerda deveria liderar, na nossa opinião, seria um constante apelo a que as esquerdas soubessem discutir entre si, um programa de governo com políticas democráticas e de inequivoco sentido socialista. Louçã, nesta entrevista do Público, prefere avançar já para um cenário que pressuporia, desde já, o esfrangalhamento do PS e até do PCP.
Fixemos esta parte da entrevista, sobre o PS:
Pergunta: O PS de Sócrates é então igual ao de Ferro Rodrigues.
Resposta: Não, têm políticas diferentes. Mas como se percebeu Ferro Rodrigues não tinha qualquer peso do PS que fosse determinante. José Sócrates é o PS.
É completamente errada a afirmação de que "José Sócrates é o PS". Pelo PS ainda estão, para citar os mais conhecidos, Manuel Alegre, a sua corrente de "Opinião Socialista" e a corrente "Esquerda Socialista". Mas também devem lá estar um número considerável de militantes que por lá ficam, porque não encontram, para já, na cena política portuguesa, qualquer alternativa ao "seu" PS. Apesar de também não se identificarem com a direcção de Sócrates.
Francisco Louçã assim, só influencia negativamente qualquer reorganização - que é necessária e urgente! - do espaço da esquerda socialista em Portugal.
Mesmo relativamente a Manuel Alegre, parece que existe alguma obsessão por uma personalidade de teve (!) um milhão de votos, mas que agora, pelo percurso que entretanto já teve, muito dificilmente os voltaria a conquistar. Ora Manuel Alegre até representa uma esquerda do PS que nem está representada na direcção do PS. Quem desenvolve algum trabalho militante no seio do PS, com posições à esquerda, tem sido a corrente "Esquerda Socialista" que até elegeu, no último Congresso PS, alguns membros para a Comissão Nacional.
Louçã não pode falar do PS como se o PS fosse o seu Bloco. O PS tem os seus militantes e cabe aos seus militantes mudarem o que conseguirem mudar. Mesmo que essa mudança não se faça ao ritmo que Louçã queira.
A paciência eterna (!) que Louçã demonstra para Alegre, deveria ser a mesma que deveria mostrar para com os militantes do PS. Militantes que não são todos pró-Sócrates, como se viu nas mobilizações dos professores, por exemplo.
Qualquer pessoa que queira mudar de políticas, que queira outro governo para Portugal, ficará um tanto ou quanto confusa com a entrevista de Louçã, no que diz respeito à definição da "maioria de esquerda". Porque o Bloco, a partir do momento que edita um programa de governo e fala em "maioria de esquerda" para governar, tem de ser mais claro quanto à definição dessa maioria. As pessoas votam no que existe e não no que seria melhor existir! E é no que existe que devem ser encontradas alternativas que mobilizem as pessoas para outro governo e outras políticas.
João Pedro Freire
3 comentários:
Juntando PCP com Bloco e uma minoria do PS - vá lá, digamos 15% do seu eleitorado - este partido teria 20% da soma dos dois primeiros mais 5% destes últimos.
Porreiro, pá, 25%.
E agora?
Que tipo de políticas apresentar?
É o descalabro, esta busca pelo Poder, por parte do Bloco. Não fosse Louçã um político do calibre que é, e o Bloco já teria entrado em descrédito. Se por um lado, hoje em dia misturar Maoístas, Hoxhistas, Trotskistas e Estalinistas, não é crime nenhum porque a Revolução está tudo menos iminente, só se pode aceitar uma coligação tão grande à esquerda se não ficarem os "socialistas" (do P"S") em minoria (caso contrário perde-se a causa da Esquerda). Se eles ficarem em minoria significa que não terão influências, e para isso não saem eles do PS, onde têm poiso garantido.
São tudo manobras. Louçã fez um belo percurso desde o PSR e o Bloco tem vindo a ser cada vez mais influente, mas que sentido faz realmente tentar crescer se não há eleitorado para isso? Só largando a causa do anti-capitalismo isso poderá suceder, e nesse caso, essa coligação será o PS do pós-25 de Abril.
Independentemente da opinião, publicámos o comentário. Só não apreciamos é que seja "Anónimo".
João Pedro Freire
Tribuna Socialista
Já agora, vi o debate entre o Louçã e o Sócrates, e admira-me que o Louçã não tenha usado das muitas oportunidades que teve para desfazer Sócrates. Embora tivesse sido vagamente mencionado, não percebo porque é que Louçã não tornou bem claro que uma educação e uma saúde gratuitas eliminariam a necessidade de fazer deduções fiscais para as despesas nessas áreas. Nem percebo porque é que, ao ser confrontado com a dicotomia "esquerda moderada - esquerda radical", Louçã não disse que não havia uma esquerda moderada e uma esquerda radical, mas apenas uma esquerda e uma não-esquerda, em que o PS pertence à última. Também podia ter tornado mais claro que uma das principais justificações da nacionalização da banca é a redução do custo dos serviços bancários para as empresas e para os particulares, pela eliminação do lucro da banca.
Em suma, Louçã não é lá muito bom a debater.
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