tribuna socialista

sexta-feira, junho 10, 2011

BLOCO DE ESQUERDA: DAR A PALAVRA AOS BLOQUISTAS!

A esquerda nasce do protesto, mas tem de saber passar à afirmação de alternativas que mobilizem
Há pouco mais de um mês, na VII Convenção Nacional do Bloco de Esquerda, a Moção B, de que fui o primeiro subscritor, inscrevia essa constatação da realidade. Uma semana depois das eleições de 5 de Junho, essa constatação corresponde, na minha opinião, a uma das causas para a derrota das esquerdas, em especial, da esquerda socialista e anti-capitalista, representada pelo Bloco de Esquerda.

No decurso da Convenção Nacional do Bloco de Esquerda, referi em todas as minhas intervenções, pela então Moção B, que era imperioso que a direcção política do Bloco, soubesse explicar e esclarecer o que entendia por “alternativa de esquerda” e por “governo de esquerda”. Nunca o fez, aparecendo as importantes medidas que o Bloco foi apresentando, dia após dia da campanha eleitoral, como algo que as pessoas nunca compreenderam como poderiam ser aplicadas com êxito para as suas vidas.

Também na Moção B, foi referido “O Bloco de Esquerda , para essa alternativa de esquerda, deve assumir-se como mais um instrumento político. Não somos, só por nós, a alternativa. Mas somos parte imprescindível dela. Deveremos apelar a uma nova cultura de diálogo entre as diversas correntes de esquerda. Sem isso, qualquer alternativa ficará só por mais apelos a adicionar aos milhares que já se fazem, desde Abril de 1974, sem consequências práticas.”

Dissemo-lo na Convenção do Bloco e registámos que, ao longo da campanha eleitoral, o clima entre as diversas forças das esquerdas foi sempre comparável a uma espécie de paz podre … nos meandros da blogosfera e do facebook, essa paz podre foi sempre substituída por um clima de guerrilha muito activa, com constantes ataques mútuos entre os militantes do Bloco e os do PCP. Culpas? Quem esteve atento, certamente que concordará que foram mútuas e com prejuízos políticos muito sérios para a tal “alternativa de esquerda”. Por isto, somos levados a concluir que o encontro acontecido entre as direcções do BE e do PCP, foi um encontro fortuito, uma espécie de encontro para conversa à mesa de café …

Quase nunca esses ataques entre as esquerdas, essas agressões protagonizadas por membros das chamadas direcções intermédias (!), corresponderam a qualquer debate político sério sobre propostas políticas sérias. Pura diversão que terá levado muitas pessoas a interrogarem-se sobre a vontade concretas das esquerdas produzirem alternativas sérias de governo e de políticas.

Tudo isto a acontecer, enquanto à direita, PSD e CDS ensaiavam já, mais uma vez, disponibilidade para se assumirem como alternativa de governo …

Mas o mais impressionante, e, também o disse na Convenção do Bloco de Esquerda, é que, à esquerda, também se falhou na compreensão dos novos movimentos sociais. Apesar de todos encherem a boca com esses movimentos. Apesar também de, também à esquerda, muitos se terem disponibilizado, no terreno social, para o apoio a esses movimentos sociais. Mas, disse-o e afirmo-o novamente, muito desse apoio de alguns activistas de esquerda aos novos movimentos sociais, cheirou a velhas cartilhas vanguardistas e caducas de, apoiar o movimento para depois tentar atrelá-lo, encarneirá-lo, à tal “vanguarda” de que alguns ainda não se libertaram verdadeiramente.

O Bloco de Esquerda foi um dos grandes derrotados em 5 de Junho. Todas e todos os militantes bloquistas foram derrotados. Eu também me considero derrotado. Mas nesta assumpção colectiva de derrota, não deve ser esquecido o papel nessa derrota que teve a direcção política bloquista. Não foi Francisco Louçã o derrotado. Foi toda a direcção política! E foi a direcção política que o é, desde a fundação do Bloco de Esquerda. De facto, formalmente a “última” só foi eleita há pouco mais de um mês. Mas esta “última” é a mesma, politicamente falando, desde a fundação do Bloco.

E esta linha de continuidade da direcção política do Bloco de Esquerda é que traz para o debate, o pedido da sua demissão ou não.

Porque esta direcção política é a mesma que já traz consigo uma série de responsabilidades políticas que tomou sem nunca ter consultado democraticamente os militantes bloquistas. E ao longo dos 12 anos de Bloco, é possível constatar que esta direcção política tem, cada vez mais, olhado para o Bloco de uma forma paternalista, como se sem ela, tudo evoluiria para o caos …

Com esta direcção política, não é exagerado afirmar que o “centralismo democrático” parece querer acordar, cada dia que passa, e, o mais caricato, parece que acorda unido a um parlamentarismo que parece ditar toda a chamada “agenda” bloquista.

É sintomático do que afirmo, o modo como o debate é encarado pela direcção política. À boa maneira “centralista”, tem surgido sempre depois de tomada a decisão pela direcção … Isto pode ser próprio de um partido “leninista-estalinista”, mas não é, de certeza, a prática de quem estatutariamente se afirma como “partido-movimento” …

Qualquer bloquista sabe o que se passou com as últimas eleições presidenciais. Como a direcção política ignorou, desvalorizou e até caluniou mais de trezentos militantes que pediam uma Convenção Nacional Extraordinária para … discutir a decisão a tomar! Como sabe também o que se passou com a Moção de censura apresentada pelo BE. Pessoalmente, estou entre os que defendeu a pertinência da apresentação dessa Moção. Discuto e ponho em causa, isso sim, o processo que culminou no anúncio da Moção de censura e na total desvalorização do órgão máximo bloquista entre Convenções, a Mesa Nacional (MN). Nesse processo, a direcção política revelou que nem nos seus apoiantes na MN confiou …

Começam a ser muitas responsabilidades negativas para uma direcção política que, Convenção após Convenção, se tem perpetuado com desprezo pelo debate democrático e até pela transparência.
Tem sido eleita com maiorias avassaladoras? Tem, sim senhor! Mas toda a gente sabe o papel que os aparelhos partidários têm na perpetuação de maiorias que, na realidade, começam a sê-lo, mas eleitas por minorias cada vez mais pronunciadas relativamente ao total de inscritos. E, no Bloco de Esquerda, começa-se a passar isso, cada vez mais!

Para além de outro pormenor (chamemos assim ..) não menos importante. A actual maioria do Bloco é algo que corresponde a uma coligação de “associações” (PSR, UDP e PXXI) que não se assumem como tendências, como os Estatutos definem. No entanto, continuam a ter uma actividade como se ainda fossem partidos, não se sabendo se o que desenvolvem – portais, revistas, sessões e congrressos – o fazem como bloquistas e com os meios do Bloco ou como algo que não tem nada a ver com o Bloco …

Por isto, também, é que é inadiável que se exija a convocação de uma nova Convenção Nacional do Bloco de Esquerda. Não para se discutir a demissão deste ou daquele, mas para se discutir as responsabilidades políticas da direcção política bloquista desde a fundação, no estado a que o Bloco chegou …

E a Convenção é o fórum adequado. Porque uma discussão para se analisar o que a comissão política definiu, é uma espécie de pescadinha de rabo na boca com conclusões já sabidas à priori. Porque uma discussão dita descentralizada pelas estruturas concelhias e distritais é conceder a quem controla o aparelho, a continuidade desse controlo.

O fortalecimento do Bloco de Esquerda, como partido-movimento de esquerda, socialista e anti-capitalista exige uma discussão aberta para todas e todos os militantes, mas também para toda a sociedade, para todos os jovens e para todos os trabalhadores. Sem tabus, sem frases feitas e arcaicas e não restrita às fronteiras partidárias …

A resposta à crise capitalista tem de ser favorável às esquerdas, desde que estas tenham a capacidade de mostrar que conseguem construir alternativas de poder credíveis, mobilizadoras e mobilizantes.
A resposta à crise capitalista é a resposta alternativa às políticas e às soluções (!) políticas impostas pelas diversas troikas – FMI/BCE/CE e PSD/CDS/PS. É uma resposta que exige muita atenção , compreensão e até adesão à dinâmica dos novos movimentos sociais, nos seus vectores sociais e de afirmação política.

O Bloco de Esquerda tem um papel importantíssimo a desempenhar. Saiba voltar a correr por fora e saiba, no seu seio, demonstrar tanta abertura como aquela que, justamente, defende para a sociedade!

João Pedro Freire
Aderente do Bloco de Esquerda
1º subscritor da Moção B à VII Convenção Nacional do Bloco de Esquerda

2 comentários:

culturdança disse...

Caro João Freire, em meu entendet a Convenção não é um local de discussão mas sil or Orgão de decisão. Isto é, não se consegue discutir seja o que for com a profundidade que este assunto exige. Pelo contrário, penso que as assembleias concelhias e distritais, porque permite muito mais tempo de discussão, são o local indicado. Espero que as concelhias e distritasi assim o entendam e marquem as reuniões necessárias. Por outro lado, a qualidade dos membros de cada orgão não pode ser medida pela sua permanência. Oxalá seja possível encontrar camaradas com disponibilidade e capacidade suficientes para a tão apregoada mudança.
Um abraço.
Lacerda

Paulo F. Silva disse...

Pela parte que me toca, continuo à espera da convocatória para os plenários e concelhios. Só espero não ficar sentado muito tempo, à espera.