tribuna socialista

domingo, junho 10, 2007

Ainda, neste 10 de Junho...



O MEDO

Qualquer coisa está a correr mal neste país.
Que não se diga, como gosta de repetir o primeiro-ministro a propósito dos discursos da oposição, “que só sabem dizer mal, incapazes que são de apontar para o que fazemos de bom”. Se bem que a acção da oposição seja quase nula, aquela frase mostra já o que se pretende: um consenso geral obediente, a adesão apolítica do Governo como condição primeira de crítica. Mas uma coisa é a maledicência outra a crítica ; uma coisa é a obediência passiva, outra a aprovação lúcida.

Receio que a súbita conjugação entre a maneira como (não) foi esclarecida a questão da licenciatura do primeiro-ministro, as investidas contra a liberdade de expressão, e a maneira como certos jornalistas e comentadores reagiram à situação (pelo silêncio ou pela sua defesa ruidosa), venha contribuir para o clima “claustrofóbico” (Paulo Rangel) e de medo que vai progressivamente envolvendo o nosso país.

Estão-se a tomar uma série de medidas que vão no pior sentido da liberdade democrática. É o “guia das boas práticas” incentivando os funcionários públicos à denúncia (considerada como um “dever legal”) das “situações irregulares” dos colegas – uma ignomínia, um incentivo do Ministério da Justiça à corrupção moral, ao envenenamento das regras da cidadania, à delação, só imagináveis em regimes ditatoriais (que fazem do Estado um poder sagrado a que se deve tudo); é a concentração das polícias sob a tutela do primeiro-ministro, a Entidade Reguladora da Comunicação Social, o novo Estatuto do Jornalista, etc,
com disposições que apontam subtilmente numa direcção : criar um clima moralizador da vida pública, substituir os comportamentos cívicos e deontológicos por comportamentos “morais” ou de “bom senso”.

(….) O medo encolhe os cérebros, reduz o espírito, fecha os corpos. Está-se a formar um clima de medo. E o medo tem a particularidade de alastrar. Ao medo social de perder o emprego, de não subir na carreira, de perder as pensões, de não aguentar tanta pressão e constrangimento em tantos domínios, junta-se agora o medo de protestar, de falar, de se exprimir. O medo social está tornar-se político: tem-se medo do Governo, e, talvez, um dia, do primeiro-ministro.


Artigo de José Gil, revista Visão, em 3 de Maio 2007
Posted by J.B.

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