tribuna socialista

quarta-feira, maio 04, 2005

"CONSTITUIÇÃO" EUROPEIA: NÃO AO DISCURSO ÚNICO SOBRE A CHAMADA CONSTRUÇÃO EUROPEIA!

trabalhadores europeus contra a liberalização dos serviços
Antes de mais, sublinhamos o nosso empenhamento na promoção de um debate sobre a chamada “Constituição” Europeia. Um debate que também deve ser sobre as diversas concepções de Europa e que não tem existido por culpa quase exclusiva do adeptos do “sim”.

Fixemos, por exemplo, o que se passa no interior do Partido Socialista em Portugal. Debates internos nas estruturas do Partido não existem nem são promovidos. Nas páginas do órgão central, o “Acção Socialista”, é publicado um suplemento sobre a Europa que induz, quem o lê, a pensar que no PS só há uma posição, a do “sim”, e , que todos os que defendem o “não” são logo apelidados de “anti-Europa”. A direcção do PS tem assumido quanto a esta matéria uma posição anti-democrática e alinhada com o discurso unicitário que se vai impondo quanto à chamada construção europeia.

No entanto e felizmente, vão surgindo algumas posições do lado do “sim” que também pugnam pelo debate. Registamos a posição do blogue TUGIR http://tugir.blogspot.com/ e até de Vital Moreira, periodicamente nas pàginas do Público. TRIBUNA SOCIALISTA, TUGIR e Vital Moreira são exemplos na área socialista de posições contraditórias sobre a “Constituição” Europeia que não evitam a necessidade de debate e não se ignoram entre si. Pena é que deste debate não possa ser também desenvolvido no seio do PS e/ou no seu órgão central, onde aliás as nossas posições e os contributos têm sido pura e simplesmente ignorados. Quem perde é a democracia e o esclarecimento, quem ganha é a continuação da falta de informação que continua e continuará a reinar sobre assuntos ligados à Europa. Triste exemplo este que é dado pelos campeões DESTA construção europeia …

A actual construção europeia tem sido baseada no esforço de governos e não na participação das cidadãs e dos cidadãos da Europa.

Aquilo a que se chama “Constituição” Europeia espelha, ela também, o que tem sido a Europa dos governos e dos Estados. Foi redigida por uma comissão não eleita, quando existe um Parlamento Europeu, e, foi presidida por um político de direita e liberal, Giscard D’Estaing, também não eleito por ninguém.

Estar contra este estado de coisas, estar contra uma construção europeia que se faz à margem dos cidadãos, não é estar contra a Europa. É estar, isso sim, contra uma concepção de Europa que vai continuar a não saber acabar com os egoísmos nacionalistas, vai continuar a não saber contar com a particpação democrática e directa dos cidadãos, vai continuar a não se definir de que forma é que quer contruir a sua unidade (União? Federação? …)

Quanto aos nacionalismos que os adeptos do “sim” continuam a não saber evitar , ou seja, não sabem combater, relembre-se o processo de nomeação de Durão Barroso para Presidente da Comissão Europeia e a posição de alguns socialistas portugueses (com o actual Ministro António Costa à cabeça), quando fizeram uso do “argumento” (?!) “ser português” para justificar a posição – que deveria ter sido política! – perante um político que deveria ser avaliado não pela sua nacionalidade, mas pelo facto de ser de direita, liberal e, ainda por cima, pró-Bush. Quem é mau para 1ºministro em Portugal, não pode ser bom (só porque é português!...) para um cargo europeu!

Não há um projecto europeu. Existem vários! Da mesma forma que não há uma única forma de se projectar determinado modelo de desenvolvimento para Portugal. Existem vários! Que viva o pluralismo e a democracia!

Convém lembrar que a ideia de construção da unidade europeia começou por ser uma ideia e um projecto defendidos e desenvolvidos pelo movimento socialista europeu, quando a seguir ao final da 2ªguerra mundial, criou um movimento pelos Estados Unidos Socialistas da Europa. Pena é que os actuais dirigentes socialistas andem tão distraídos com as alianças que fazem com políticos e governantes de direita para defenderem uma Europa liberal e esqueçam o que os seus antecessores propunham!

TRIBUNA SOCIALISTADemocracia & Socialismo assume claramente uma posição a favor de uma Europa Democrática, Federal e Socialista. Na linha daquela que sempre foi a posição do movimento socialista europeu. Defendemos o NÃO à chamada Constituição Europeia, mas não nos revemos nas posições de muitos que também defendem o “não”. Nomeadamente os que persistem em posições nacionalistas, como algumas correntes de esquerda, afectas aos partidos comunistas anteriormente pró-URSS. Porque somos europeístas socialistas e de esquerda, porque lutamos por uma cidadania europeia como forma de se consolidar a Paz, a Democracia e a unidade europeia.

Consideramos que a construção europeia não pode prescindir da participação democrática de todos os europeus. E, até hoje, essa participação não só não tem existido, como não é fomentada, sendo as diversas eleições para o Parlamento Europeu com taxas de abstenção recordes, uma prova desse enorme deficit democrático que tem caracterizado esta construção europeia liberal.

A dita Constituição Europeia por entre alguns formalismos democráticos, mais não faz que reproduzir num único documento toda a concepção liberal e não democrática que tem norteado a chamada construção europeia desde os tempos da CEE até hoje.

Primeira consideração sobre a Constituição Europeia. Não rejeitamos a existência de uma Constituição para a Europa. Consideramos que o processo para a sua redacção e definição deverá ser participativo e democrático, nomeadamente com a eleição de uma Constituinte Europeia por todos os Europeus. Entendido por europeus todas e todos os que residam em qualquer país europeu. A Europa deve ser um espaço democrático, inter-étnico, multirracial e de paz.

Segunda consideração. Qualquer decisão democrática é sempre diferente da exigência de unanimidade. Ora a chamada Constituição Europeia usa e abusa da exigência de unanimidades.

Vamos então a questões mais concretas:

1 – Somos por uma Constituição que se limite a fixar as regras do jogo. O que se quer aprovar como Constituição mais parece um texto programático liberal e, ainda por cima, imutável. As duas primerias partes (or objectivos e as instituições da União e a Carta dos Direitos do Homem) e a quarta parte, têm claramente lugar no quadro de uma Constituição. No entanto, três partes representam somente um quarto do texto global. A terceira parte tem já um carácter legislativo. Decide sobre a natureza das directivas europeias que vierem a ser definidas. As politicas liberais adoptadas pelas directivas europeias ao longo dos últimos 20 anos serão assim como que gravadas na rocha! Nenhuma maioria europeia poderá ter a veleidade de alterar qualquer directiva sem antes alterar a Constituição. Ora é uma alteração quase impossível, já que será preciso obter o acordo unânime dos 25 estados membros!!

2 – Somos por uma Constituição que possa ser revista! É um direito democrático elementar a possibilidade de revisão constitucional por 2/3 ou por 3 / 4. É isso que tem acontecido, por exemplo, com a Constituição da Republica Portuguesa.
No caso da Constituição Europeia qualquer revisão, ordinária ou simplificada, não poderá acontecer sem que se verifique a unanimidade do Conselho de Chefes de Estado e de governo. Em questões consideradas mais comlexas e importantes, é necessária uma segunda unanimidade: a dos estados membros que deverão ractificar essa modificação por referendo nacional ou votação nos Parlamentos nacionais. É fácil concluir que uma dupla unanimidade numa União a 25 é quase uma impossibilidade!

3 – Queremos uma democracia europeia que funcione e que não seja uma mera formalidade. Ora com a dita Constituição o essencial do poder é detido por organismos não eleitos, fora de todo e qualquer controlo cidadão: o Conselho de Chefes de Estado e de governo, o Conselho de Ministros, a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu, o Tribunal Europeu. O Parlamento que é o único organismo eleito pró sufrágio universal é o que fica com menos poderes. Contráriamente ao que era suposto acontecer tendo em conta o seu titulo de “Parlamento”, ele não detém que uma pequena parte do poder legislativo, do poder de votar as leis da União (as chamadas directivas). Portanto, mais de 70% dos actos legislativos e regulamentares integrados anualmente na legislação dos Estados membros são provenientes de decisões europeias.
O domínio da co-decisão (domínio legislativo que o Parlamento partilha com o Conselho de Ministros) é estendido a 29 novos domínios.
Mas os poderes do Parlamento europeu ficarão muito longe dos poderes de um Parlamento de uma democracia.
Numa democracia, o Parlamento partilha a iniciativa das leis com o governo, só vota as leis e o Orçamento Geral do Estado. A Constituição europeia não contempla nada disso. A iniciativa das leis (das chamadas directivas) continuarão a pertencer unicamente à Comissão Europeia (artigo I-26, alinea 2).
Os partidários do “sim” falam de um novo direito reconhecido pela Constituição: o direito de petição. A possibilidade de submeter à Comissão uma petição assinada por um milhão (ou mais) de cidadãos europeus seria, segundo os adeptos do “sim”, a inauguração de uma nova era de “democracia participativa” na Europa. Mais uma ilusão!
O direito de petição é completamente esvaziado do seu conteúdo através do artigo I-27 que fixa três limites: 1ºlimite – a petição mais não fará que convidar a Comissão a submeter essa petição ao Parlamento e ao Conselho. A Comissão poderá nada fazer e, dentro de toda a legalidade constitucional, reduzir a petição a um bocado de papel. 2º limite – a forma e o conteúdo da petição, se for submetida ao Parlamento ou ao Conselho para passar a directiva, dependerá inteiramente da Comissão que deverá remeter a estes organismos “uma proposta apropriada”. 3º limite – qualquer petição para avançar terá sempre de ter um conteúdo “compatível com os fins da Constituição”
4 – Recusamos uma Constituição que não permite a harmonização das legislações sociais. O artigo III-210 alinea 2 (secção 2 – Politica Social) não podia ser mais claro:”exclusão de toda a harmonização das disposições legislativas e regulamentares dos Estados membros”. Isto significaria que a instauração de um salário mínimo europeu para impedir a concorrência com base em baixos salários não seria permitido! Ou seja, a harmonização social por baixo será imposta pelo mercado.

5 – Somos por direitos sociais reais e não somente virtuais. A Carta dos Direitos Fundamentais (parte II da Constituição) não obriga nem a União Europeia, nem os Estados membros a aplicarem os direitos enunciados na Carta.
Por exemplo, um Estado membro da União que não reconheça o direito à greve, através do artigo II-88, poderá nunca vir a aplicar o direito à greve!

6 – O serviços públicos ficam em perigo com uma Constituição que nos faz referência a eles! É uma Constituição que impõe um modelo baseado na total liberalização e que acaba por contribuir para as deslocalizações em massa.

O que está em causa com a chamada “Constituição” Europeia é a imposição de um modelo que pode permanecer imutável durante mais de 50 anos, como reconheceu o próprio Giscard D’Estaing, presidente não eleito da comissão não eleita que redigiu o “Tratado Constitucional Europeu”. A imposição de um modelo que a grande maioria dos partidários do “sim” continua a fazer evitando o debate e o esclarecimento.

TRIBUNA SOCIALISTADemocracia & Socialismo estará sempre disponível para o debate aqui na blogosfera ou em qualquer outro ambiente. Interessa-nos, em primeiro lugar, debater à esquerda, já que estamos convencidos que é nesta área que surgirão as forças necessárias para a construção de uma Europa livre do liberalismo que tem tornado a democracia uma mera formalidade.
Posted by Hello

1 comentário:

Unknown disse...

"Convém lembrar que a ideia de construção da unidade europeia começou por ser uma ideia e um projecto defendidos e desenvolvidos pelo movimento socialista europeu, quando a seguir ao final da 2ªguerra mundial, criou um movimento pelos Estados Unidos Socialistas da Europa. Pena é que os actuais dirigentes socialistas andem tão distraídos com as alianças que fazem com políticos e governantes de direita para defenderem uma Europa liberal e esqueçam o que os seus antecessores propunham!"
????
Totalmente falso
Gosto de ir a bibliotecas ler jornais antigos.
Já li em jornais da década de trinta do Século passado relato de reuniões a nível de Ministro dos Negócios Estrangeiros para o lançamento dos Estados Unidos da Europa.
Curiosamente, num desses relatos um dos temas em discussão (por iniciativa do Ministro Italiano) era se se devia ou não convidar a Turquia para integrar os tais Estados Unidos da Europa.
Depois durante a guerra Hitlar apelou nitidamente à unidade europeia. Li uma vez um discurso do Comissário que o Hitler tinha colocado a mandar na Holanda, sobre as vantagens económicas da abolição de fronteiras e livre circulação de cidadãos. Este discurso, expurgado de algumas referências nazis podia perfeitamente passar por um discurso actual.
E, escuso de referir o movimento de extrema direita Jeune Europe do belga JEAN THIRIART que creio ser quem lançou a cruz celtica como emblema da extrema direita posterior à guerra e que cá em Portugal tinha uma sucursal, o movimento Jovem Portugal acarinhado pela PIDE e pela Legião Portuguesa.
E por fim o mote de qualquer progressista não deve ser Não ao discurso único sobre a chamada Constituição Europeia, mas sim, Não ao Império Europeu.